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CARTA DE APOIO AO PROJETO DA UNILAB

Foi com muita preocupação que nós, membros do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal do Amapá – Neab/Unifap, recebemos a informação, veiculada no sítio internet da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), de uma modificação intempestiva nos termos do Edital n.º 17/2017, que trata da seleção de estudantes estrangeiros, extinguindo as modalidades de auxílio financeiro que atualmente possibilitam a permanência na Unilab desses estudantes, cujo visto obviamente não permite o exercício de atividades remuneradas no Brasil.

A Unilab é um projeto inovador e audacioso, que é acompanhado com atenção e simpatia pelo conjunto dos atores sociais brasileiros empenhados na luta pela redução das desigualdades regionais, sociais e raciais que caracterizam historicamente nosso país e que vêm impedindo o seu pleno desenvolvimento econômico tanto quanto humano. Este interesse social amplo, deriva da própria missão institucional fixada na Lei n.º 12.289/2010, que criou a instituição, em seu Art. 2º, nomeadamente a formação de “recursos humanos para contribuir com a integração entre o Brasil e os demais países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP, especialmente os países africanos” além da promoção do “desenvolvimento regional e o intercâmbio cultural, científico e educacional”. Além disso, a localização dos campi no interior dos estados do Ceará e da Bahia é um indicativo do potencial da Unilab de realizar outra missão igualmente importante: a de contribuir para a democratização do ensino superior no Brasil, propiciando o acesso à universidade e a ampliação das possibilidades de ascensão social a populações historicamente mantidas à margem dos diplomas acadêmicos. Finalmente, a relação forte com a África e a própria presença de um significativo contingente de estudantes africanos reforça o caráter antirracista desta iniciativa, aliás expresso no próprio nome da universidade e na escolha do local para sua sede, o município cearense pioneiro na emancipação maciça das pessoas que ali viviam escravizadas, em 1883.

Por todas essas razões e por conta das grandes expectativas sociais investidas no projeto da Unilab, causou-nos enorme estranheza a medida tomada pela administração superior da universidade, no sentido de extinguir todas as formas de auxílio que permitem a permanência de estudantes estrangeiros na universidade a partir da próxima seleção. Como deve ser óbvio para qualquer observador minimamente bem informado, a simples eliminação dos mecanismos de permanência atualmente existentes, como proposto, levará inexoravelmente à drástica diminuição do número de estudantes estrangeiros que chegam a se matricular na Unilab, descaracterizando o projeto original da Universidade de forma brutal.

Maior ainda é a perplexidade ao se verificar que, no processo de recredenciamento a que a Unilab foi submetida há poucos dias, metade das poucas notas máximas obtidas deriva diretamente das características específicas do seu projeto. É especialmente relevante a opinião dos avaliadores do Ministério da Educação, que escreveram em seu relatório, divulgado no sítio internet da própria instituição:

A IES tem a questão da internacionalização no seu dia-a-dia e no próprio nome. A UNILAB busca integrar-se internacionalmente por meio da lusofonia e da identificação de problemas comuns, para estabelecimento de cooperação técnica com os países parceiros e assim, promover a cooperação Sul-Sul, com o objetivo de fomentar a inovação junto aos países em desenvolvimento, por meio de uma sólida formação em recursos humanos.

 

Se é grave o problema de financiamento enfrentado pelas universidades públicas brasileiras, isso não as exime de buscar consensos internos e soluções que garantam o cumprimento de sua missão institucional. No caso da Unilab, é preciso observar que a distinção ora operada entre mecanismos de permanência voltados para estudantes estrangeiros (a serem extintos) e aqueles voltados para estudantes brasileiros (a serem mantidos) não se justifica como medida de contenção de gastos, arriscam promover a xenofobia e o racismo, e terminam por se caracterizar como discriminação pura e simples. Por outro lado, não é razoável supor que a quantidade de bolsas de iniciação científica, iniciação à docência, extensão, monitoria e outras ofertadas pela Unilab poderão suprir em qualquer medida estatisticamente significativa a demanda deixada a descoberto pela extinção dos auxílios financeiros à permanência dos estudantes estrangeiros na universidade.

Em vista do exposto, apelamos à Administração da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, pessoa do seu Magnífico Reitor Pro Tempore,  o Dr. Anastácio de Queiroz Souza, no sentido de rever, o mais brevemente possível, esta decisão contra a qual a comunidade acadêmica da Unilab, bem como outras instituições de outros estados brasileiros que em sua missão institucional, visam a eliminação da Xenofobia, Racismo e todas as formas de discriminação correlatas, têm clamado em alto e bom som, por meio de diversas mídias sociais, e buscar, em um processo de amplo diálogo com estudantes, técnicos e professores, equacionar as dificuldades impostas pela escassez de recursos com a missão legalmente atribuída à Unilab.

Cesar dos Santos Rodrigues Filho

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